choque policia pm junho 2013 rio protesto prefeituraGrande parte dos presentes às recentes manifestações são da geração Y, composta por nascidos pós 1980, considerados “nativos digitais”. Essa geração cresceu com os jogos eletrônicos, que lhes impunham desafios a serem superados. Há aí então uma percepção de que a estratégia do governo de aumento da repressão policial na verdade intensifica a mobilização social, isso porque trata-se de uma gamificação dos protestos. Quanto maior o desafio, mais instigados ficam os manifestantes, que bolam estratégias para vencer o grande adversário. Tal ponto de vista explica a elevação da mobilização após a repressão das forças policiais. A cada “fase”, os manifestantes encontram desafios mais difíceis e se aperfeiçoam para superá-los.

O compartilhamento de estratégias de ativismo é uma das consequências desse fenômeno, já que, além de superar os desafios, percebe-se a intenção de “vencer juntos o jogo”, assim como nos sites que divulgam tácticas para games. A mídia também adota um postura gamificada na medida em que atua em primeira pessoa e com a mesma postura que um manifestante. A chamada mídia NINJA trabalha com o mesmo ponto de vista que os presentes no protesto. Além disso, na oposição manifestantes x policiais, os comunicadores populares ficam juntos dos primeiros, já que possuam mais proximidade ideológica com os mesmos.

De outro lado, a imprensa comercial acompanha os fatos do alto de prédios e de helicópteros, sem conseguir mostrar os fatos com exatidão. Quando assumem uma ação no solo, acabam ficando do lado dos policiais, até mesmo por conta das frequentes agressões de jornalistas por parte de manifestantes. Espacialmente, a mídia livre e a mídia corporativa se opõem. A cobertura das mesmas segue linha idêntica.

O acontecimento que traduz melhor essa dinâmica foi a prisão de Bruno Ferreira Teles durante a visita do Papa Francisco ao Rio de Janeiro em julho de 2013. Bruno foi levado para a delegacia acusado de jogar coquetel molotov em policiais que faziam a segurança do Palácio Guanabara. A imprensa ouviu apenas a voz da Polícia Militar que dizia ainda ter apreendido com o jovem uma mochila cheia de artefatos incendiários.

Após a negativa de sua soltura por parte do Tribunal de Justiça, começou uma campanha nas redes sociais para provar a inocência de Bruno Ferreira Teles. Em menos de 48 horas, dezenas de vídeos e fotos foram publicados mostrando que tratava-se da prisão de um inocente. Após essa mobilização, as TVs abertas passaram a divulgar o material produzido pelas mídias livres pressionando o Governo do Estado a soltar Bruno e arquivar seu processo. Todo o processo mostrou a força da organização em rede, o que podemos definir como a luta entre as forças de controle e da vida.

Na mesma ocasião, houve a comprovação do caráter rizomático da mídia livre em sua organização em rede distribuída. Isso porque ao se prender um dos midiativistas que faziam a cobertura da manifestação, outro imediatamente o substituía. Esse fenômeno é bem diferente da rede centralizada implementada pela TV Globo, na qual distribui seus conteúdos para centenas de emissoras afiliadas em todo o Brasil. Como no país cada empresa só pode ser dona de 5 geradoras, a Globo só possui antenas em Recife, Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo. As outras integrantes da rede apenas repetem o sinal, numa redação de extrema dependência.

A configuração de redes descentralizadas também ajudou na ação dos midiativistas. Quando a ferramenta Twitcasting saiu do ar, migraram as transmissões para outro sistema sem deixar a comunicação ser interrompida. Essa dinâmica é a mesma da internet, onde quando um servidor cai, outro o suporta a conexão. Há de se atentar porém para o fato de existirem redes centralizadas entre os midiativistas. Tal característica é mais comum entre os veículos de comunicação alternativa que surgiram antes de 2013. O Jornal A Nova Democracia e a revista Vírus Planetário possuem quadro fixo de jornalistas. Quando um dos comunicadores é detido pela polícia, a cobertura fica prejudicada. Situação similar ocorre com a Mídia NINJA ao centralizar sua coordenação no grupo Fora do Eixo. Acabam atuando como ‘autoridade’ e não como ‘hub’. Autoridades são veículos com o propósito de difundir informação, falando mais e interagindo pouco. Já os ‘hubs’ fazem circular informações produzidas por parceiros. A postura de autoridade é exercida por portais currais como G1, Estadão, além da Mídia NINJA no período inicial. A participação de um Hub permite a intensa troca entre os nós criando uma comunidade de mídiativismo com múltiplas conexões e formatos.

Arthur William Cardoso Santos
Arthur William Cardoso Santos

Arthur William Santos é mestre em Educação, Cultura e Comunicação (UERJ), pós-graduado no MBA de TV Digital, Radiodifusão e Novas Mídias de Comunicação Eletrônica (UFF), graduado em Comunicação Social / Jornalismo (PUC-Rio) e técnico em eletrônica (CEFET-RJ). Foi gerente executivo de Produção, Aquisição e Parcerias na EBC, além de gerenciar o setor de Criação de Conteúdos e coordenar as Redes Sociais da TV Brasil. Liderou também a área de Inovação/Novos Negócios na TV Escola. Atuou ainda na criação do Canal Educação e do Canal LIBRAS para o Ministério da Educação (MEC). Fez cursos presenciais em Harvard e Stanford sobre Inovação na Educação. Deu aulas em cursos de graduação e pós-graduação nas universidades UniCarioca, Unigranrio, FACHA, INFNET e CEFOJOR (Angola). É membro da SET (Sociedade de Engenharia de Televisão).

Share This